Visando à efetivação do direito fundamental constante do inciso LXXVII do artigo 5º Constitucional, o qual dispõe que “são gratuitas as ações de habeas-corpus e habeas-data, e, na forma da lei, os atos necessários ao exercício da cidadania”, foi publicada a Lei Federal 9.265/96, prevendo a gratuidade de diversos “atos necessários ao exercício da cidadania”.
Na primeira versão legislativa, o registro civil de nascimento, o assento de óbito e as primeiras respectivas certidões não foram abrangidos pela gratuidade. Por força da Lei 9.534, publicada já em 1997, foi modificada aquela Lei de 1996 para a inclusão do inciso VI no artigo 1º prevendo a gratuidade desses atos cartorários.
Como forma de compensação aos Registradores Civis das Pessoas Naturais, que deixaram de auferir receita em relação a esses serviços públicos prestados, foi elaborada e publicada a Lei Federal 10.169, de 2000, que, dentre outras questões a respeito da fixação de emolumentos, estabeleceu que:
“Art. 8o Os Estados e o Distrito Federal, no âmbito de sua competência, respeitado o prazo estabelecido no art. 9o desta Lei, estabelecerão forma de compensação aos registradores civis das pessoas naturais pelos atos gratuitos, por eles praticados, conforme estabelecido em lei federal.
Parágrafo único. O disposto no caput não poderá gerar ônus para o Poder Público.”
No que importa ao tema proposto, um aspecto do dispositivo deve ser destacado:
A regra tem flagrante efeito retroativo, na medida em que determina o estabelecimento de “forma de compensação aos registradores civis das pessoas naturais pelos atos gratuitos, por eles praticados”.
Não é exagero afirmar que o artigo 8º anteriormente citado veio a lume para, mesmo alguns anos depois, retificar o equívoco legislativo perpetrado alhures, que retirou dos registradores a fonte de custeio e de remuneração pela prática de determinados atos cartoriais sem, em contrapartida, indicar uma forma de recompensá-los pelos serviços prestados.
Propositalmente, para que tivesse efeito retrooperante e atingisse os atos gratuitos praticados pelos registradores desde 1997, o tempo verbal utilizado é o passado (“atos gratuitos, por eles praticados”).
Se assim não o fosse, a redação do dispositivo legal seria absolutamente outra, isto é, seguindo a melhor técnica legislativa, o texto teria sido redigido no presente ou no futuro simples do presente. A propósito disso, vale a transcrição do artigo 11, I, “d”, da Lei Complementar 95/98, que, sobre técnica de redação legislativa, prevê, in verbis:
“Art. 11. As disposições normativas serão redigidas com clareza, precisão e ordem lógica, observadas, para esse propósito, as seguintes normas:
I – para a obtenção de clareza:
(...)
d) buscar a uniformidade do tempo verbal em todo o texto das normas legais, dando preferência ao tempo presente ou ao futuro simples do presente;”
Em virtude de tudo isso, a Lei 10.169, embora tenha sido publicada já nos idos de 2000, produz efeitos, retrooperantemente, desde o início da vigência da Lei 9.534/97, que, com visto, instituiu a gratuidade dos atos registrais civis.
RODRIGO GROBÉRIO BORBA
Advogado - OAB/ES 11.017
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