STJ publica decisão final sobre ISS
Publicado em 24/08/2010
Superior Tribunal de Justiça
RECURSO ESPECIAL Nº 1.185.119 - SP (2010/0047037-7)
RELATOR : MINISTRO BENEDITO GONÇALVES
RECORRENTE : FRANCISCO DE ASSUMPÇÃO PEREIRA DA SILVA
ADVOGADO : RUBENS HARUMY KAMOI E OUTRO(S)
RECORRIDO : MUNICÍPIO DE SÃO CARLOS
PROCURADOR : ELCIR BOMFIM E OUTRO(S)
EMENTA
TRIBUTÁRIO. RECURSO ESPECIAL. ISS. ATIVIDADE NOTARIAL E DE REGISTRO PÚBLICO. REGIME DE TRIBUTAÇÃO FIXA. ARTIGO 9º, § 1º, DO DECRETO-LEI N. 406/68. AUSÊNCIA DE PESSOALIDADE NA ATIVIDADE. INAPLICABILIDADE.
1. A controvérsia do recurso especial cinge-se ao enquadramento dos cartórios no regime de tributação fixa, conforme disposição do artigo 9º, § 1º, do Decreto-Lei 406/68, cuja vigência é reconhecida pela jurisprudência deste Tribunal Superior. Precedentes: REsp 1.016.688/RS, Primeira Turma, Rel. Min. José Delgado, DJe de 5.6.2008; REsp 897.471/ES, Segunda Turma, Rel. Min. Humberto Martins, DJ de 30.3.2007.
2. Os serviços notariais e de registro público, de acordo com o artigo 236 da Constituição Federal, são exercidos em caráter privado por delegação do Poder Público.
3. Ainda que essa delegação seja feita em caráter pessoal, intransferível e haja responsabilidade pessoal dos titulares de serviços notariais e de registro, tais fatores, por si só, não permitem concluir as atividades cartoriais sejam prestadas pessoalmente pelo titular do cartório.
4. O artigo 20 da Lei n. 8.935/94 autoriza os notários e os oficiais de registro a contratarem, para o desempenho de suas funções, escreventes, dentre eles escolhendo os substitutos, e auxiliares como empregados. Essa faculdade legal revela que a consecução dos serviços cartoriais não importa em necessária intervenção pessoal do tabelião, visto que possibilita empreender capital e pessoas para a realização da atividade, não se enquadrando, por conseguinte, em prestação de serviços sob a forma de trabalho pessoal do próprio contribuinte, nos moldes do § 1º do artigo 9º do Decreto-Lei n. 406/68.
5. Recurso especial não provido.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos os autos em que são partes as acima indicadas, cordam os Ministros da Primeira Turma do Superior Tribunal de Justiça prosseguindo o julgamento, após o voto-vista do Sr. Ministro Luiz Fux, por unanimidade, negar provimento ao recurso especial, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator. Os Srs. Ministros Hamilton Carvalhido, Luiz Fux (voto-vista) e Teori Albino Zavascki votaram com o Sr. Ministro Relator.
Não participou do julgamento o Sr. Ministro Arnaldo Esteves Lima (RISTJ, art. 162, § 2º, primeira parte)
Brasília (DF), 10 de agosto de 2010(Data do Julgamento)
MINISTRO BENEDITO GONÇALVES - Relator
Superior Tribunal de Justiça
RECURSO ESPECIAL Nº 1.185.119 - SP (2010/0047037-7)
RELATOR : MINISTRO BENEDITO GONÇALVES
RECORRENTE : FRANCISCO DE ASSUMPÇÃO PEREIRA DA SILVA
ADVOGADO : RUBENS HARUMY KAMOI E OUTRO(S)
RECORRIDO : MUNICÍPIO DE SÃO CARLOS
PROCURADOR : ELCIR BOMFIM E OUTRO(S)
RELATÓRIO
O SENHOR MINISTRO BENEDITO GONÇALVES (Relator): Cuida-se de recurso especial interposto por Francisco de Assumpção Pereira da Silva, com fundamento no artigo 105, III, "a", da Constituição Federal, contra acórdão do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, consubstanciado nos termos da seguinte ementa:
APELAÇÃO CÍVEL- Ação Declaratória - ISS incidente sobre serviços prestados por notórios e oficiais de registro - Serviços delegados exercidos em caráter privado - Natureza sui generis da contraprestação, sendo taxa o valor direcionado ao Estado e remuneração o montante direcionado ao agente delegado, passível de sujeição ao ISS Diferenciação com outros serviços públicos não permitida pela norma constitucional, sob pena de violação ao princípio da isonomia - Matéria julgada pelo STF na ADI 3089, decidindo pela constitucionalidade da incidência do ISS sobre os serviços prestados pelos notórios e registradores - Inaplicabilidade da regra contida no art 9º do Decreto-lei n° 406/68 - Serviços que não são desenvolvidos com a mesma pessoalidade inerente a outras profissões, como médico, advogado etc – Recursos oficial e voluntário da Municipalidade providos.
Noticiam os autos que Francisco de Assumpção Pereira da Silva ajuizou declaratória contra o Município de São Carlos para impugnar a cobrança de ISS incidente sobre os serviços cartorários, notariais e de registro. Em suma, o autor se insurgiu contra a Lei Complementar n. 116/2003 e a Lei Municipal n. 13.263/2003, que fixou a alíquota em 2% (dois por cento) sobre o valor dos serviços prestados.
O Juízo singular julgou procedente o pedido para reconhecer a inconstitucionalidade dos itens 21 e 21.11 da Lista de Serviços da Lei Municipal n. 13.263/03 e, por conseguinte, declarar a inexistência de relação jurídica e condenar o Município ao pagamento de honorários advocatícios arbitrados em R$ 800,00 (sentença às fls. 152-164).
O Tribunal de origem deu provimento ao apelo do município e reformou a sentença por entender que a incidência do ISS sobre os serviços cartórios é constitucional e rechaçou o
enquadramento do autor na previsão contida no artigo 9º, § 1º, do Decreto-Lei n. 406/68 por se tratar de uma atividade empresarial, nos termos do acórdão de fls. 266-280.
Em sede de recurso especial, o recorrente sustenta a negativa de vigência ao artigo 9º, § 1º, do Decreto-Lei n. 406/68, nestes termos (fl. 292):
Note-se que a mencionada Lei Complementar adota alíquota mínima de 2% e a máxima de até 5%, estabelecendo como base de cálculo a receita bruta auferida em caso de pessoas jurídicas no que tange às pessoas físicas que exercem trabalho pessoal, como é o caso do recorrente, a lei estabeleceu como base de cálculo um valor fixo, tendo em vista a vigência do artigo 9º do Decreto-Lei 406/68, conforme veremos adiante.
Referida exação foi instituída pela Lei Municipal n. 13.263/03, que fixou a alíquota de 2% (dois por cento) sobre o valor dos serviços prestados pelo Recorrente.
Porém, a Requerida vem tentando cobrar o ISS sobre o rendimento bruto do Recorrente, e não como pessoa física, como deveria ser. Sendo assim, o recorrente não pode concordar com tal cobrança nestes moldes, uma vez que a tributação em face dos serviços notariais e registrais deve ser revogada pela Lei Complementar 116/03 e é perfeitamente aplicável aos notários e registradores.
Aduz que o 9º do Decreto-Lei 406/68 não foi revogado pela Lei Complementar 116/2003. Defende que o referido dispositivo trata da tributação dos profissionais autônomos e liberais e, portanto, deve ser aplicado aos notários e registradores
Contrarrazões às fls. 330-336.
Juízo negativo de admissibilidade às fls. 338-339. Contra essa decisão, o recorrente interpôs o Agravo de Instrumento n.1.162.017/SP, o qual foi dado provimento para determinar a subida do recurso especial.
É o relatório.
Superior Tribunal de Justiça
RECURSO ESPECIAL Nº 1.185.119 - SP (2010/0047037-7)
EMENTA
TRIBUTÁRIO. RECURSO ESPECIAL. ISS. ATIVIDADE NOTARIAL E DE REGISTRO PÚBLICO. REGIME DE TRIBUTAÇÃO FIXA. ARTIGO 9º, § 1º, DO DECRETO-LEI N. 406/68. AUSÊNCIA DE PESSOALIDADE NA ATIVIDADE. INAPLICABILIDADE.
1. A controvérsia do recurso especial cinge-se ao enquadramento dos cartórios noregime de tributação fixa, conforme disposição do artigo 9º, § 1º, do Decreto-Lei 406/68, cuja vigência é reconhecida pela jurisprudência deste Tribunal Superior. Precedentes: REsp 1.016.688/RS, Primeira Turma, Rel. Min. José Delgado, DJe de5.6.2008; REsp 897.471/ES, Segunda Turma, Rel. Min. Humberto Martins, DJ de30.3.2007.
2. Os serviços notariais e de registro público, de acordo com o artigo 236 da Constituição Federal, são exercidos em caráter privado por delegação do Poder Público.
3. Ainda que essa delegação seja feita em caráter pessoal, intransferível e haja responsabilidade pessoal dos titulares de serviços notariais e de registro, tais fatores, por si só, não permitem concluir as atividades cartoriais sejam prestadas pessoalmente pelo titular do cartório.
4. O artigo 20 da Lei n. 8.935/94 autoriza os notários e os oficiais de registro a contratarem, para o desempenho de suas funções, escreventes, dentre eles escolhendo os substitutos, e auxiliares como empregados. Essa faculdade legal revela que a consecução dos serviços cartoriais não importa em necessária intervenção pessoal do tabelião, visto que possibilita empreender capital e pessoas para a realização da atividade, não se enquadrando, por conseguinte, em prestação de serviços sob a forma de trabalho pessoal do próprio contribuinte, nos moldes do § 1º do artigo 9º do Decreto-Lei n. 406/68.
5. Recurso especial não provido.
VOTO
O SENHOR MINISTRO BENEDITO GONÇALVES (Relator): Preenchidos os requisitos de admissibilidade recursal, passo ao exame do recurso.
Prefacialmente, quadra registrar que a questão relativa à incidência do ISS sobre os serviços de registros públicos, cartorários e notariais previstos nos itens 21 e 21.01 da Lista de serviços anexa à Lei Complementar n. 116, de 31 de julho de 2003 foi consolidada no julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade n. 3089/DF, que reconheceu a constitucionalidade da exação. Esta é a ementa do referido julgado:
Superior Tribunal de Justiça
AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. CONSTITUCIONAL. TRIBUTÁRIO. ITENS 21 E 21.1. DA LISTA ANEXA À LEI COMPLEMENTAR 116/2003. INCIDÊNCIA DO IMPOSTO SOBRE SERVIÇOS DE QUALQUER NATUREZA - ISSQN SOBRE SERVIÇOS DE REGISTROS PÚBLICOS, CARTORÁRIOS E NOTARIAIS. CONSTITUCIONALIDADE. Ação Direta de Inconstitucionalidade ajuizada contra os itens 21 e 21.1 da Lista Anexa à Lei Complementar 116/2003, que permitem a tributação dos serviços de registros públicos, cartorários e notariais pelo Imposto sobre Serviços de Qualquer Natureza - ISSQN. Alegada violação dos arts. 145, II, 156, III, e 236, caput, da Constituição, porquanto a matriz constitucional do Imposto sobre Serviços de Qualquer Natureza permitiria a incidência do tributo tão-somente sobre a prestação de serviços de índole privada. Ademais, a tributação da prestação dos serviços notariais também ofenderia o art. 150, VI, a e §§ 2º e 3º da Constituição, na medida em que tais serviços públicos são imunes à tributação recíproca pelos entes federados. As pessoas que exercem atividade notarial não são imunes à tributação, porquanto a circunstância de desenvolverem os respectivos serviços com intuito lucrativo invoca a exceção prevista no art. 150, § 3º da Constituição. O recebimento de remuneração pela prestação dos serviços confirma, ainda, capacidade contributiva. A imunidade recíproca é uma garantia ou prerrogativa imediata de entidades políticas federativas, e não de particulares que executem, com inequívoco intuito lucrativo, serviços públicos mediante concessão ou delegação, devidamente remunerados. Não há diferenciação que justifique a tributação dos serviços públicos concedidos e a não-tributação das atividades delegadas. Ação Direta de Inconstitucionalidade conhecida, mas julgada improcedente (ADI 3089, Relator Min. Carlos Britto, Relator p/ Acórdão Min. Joaquim Barbosa, Tribunal Pleno, julgado em 13/2/2008, DJe-142 Divulg 31/7/2008 Public 1/8/2008).
A controvérsia do recurso especial cinge-se ao enquadramento dos cartórios na disposição do artigo 9º, § 1º, do Decreto-Lei 406/68, cujo teor se transcreve a seguir:
Art 9º A base de cálculo do imposto é o preço do serviço.
§ 1º Quando se tratar de prestação de serviços sob a forma de trabalho pessoal do próprio contribuinte, o imposto será calculado, por meio de alíquotas fixas ou variáveis, em função da natureza do serviço ou de outros fatores pertinentes, nestes não compreendida a importância paga a título de remuneração do próprio trabalho.
O Tribunal julgou inaplicável o referido dispositivo, nestes termos (fls. 278-280):
No tocante à incidência tributária à luz do art 9º do Decreto-lei n° 406/68, este dispositivo, no § Iº, autoriza o cálculo do imposto por meio de "alíquotas fixas ou variáveis, em função da natureza do serviço ou de outros fatores pertinentes'' o que não se aplica no caso dos cartórios, pois se trata de uma entidade empresarial, que se distancia da condição de prestação de serviços na forma de trabalho pessoal, na medida em que é possível a contratação de terceiros para atuar em seu nome, posto que o art. 20 da Lei n° 8.935/94 autoriza a delegação de poderes a escreventes para a prática de determinados atos para os quais forem investidos de autoridade pelo titular, nada impedindo, ainda, a designação de substituto para responder pelo serviço na ausência ou impedimento do titular.
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De sorte que, em que pese a existência de responsabilidade pessoal, isso não implica que o trabalho seja desenvolvido com a mesma pessoalidade inerente, por exemplo, ao médico, ao advogado, ao engenheiro etc, sobretudo porque, em caso de danos causados por seus prepostos, é assegurado o direito de regresso e, ainda, a responsabilidade criminal será sempre individualizada, atribuindo-se a cada um a culpa que lhe couber. No caso de outras profissões não há como delegar as tarefas atinentes ao profissional, pois, enquanto o notário ou oficial de registro pode delegar a prática dos atos de sua incumbência aos escreventes substitutos e auxiliares, ao médico, ao advogado, ao engenheiro, por exemplo, esta prática é absolutamente inviável, dada a natureza pessoal das atividades desenvolvidas, o que não se observa no caso dos notários e registradores.
Com efeito, um serviço cartorário pode ser realizado por um escrevente contratado, mas uma cirurgia jamais poderá ser feita senão pelo próprio médico, diferenciando aí a pessoalidade da relação estabelecida entre um e outro, o que, no caso em tela, desaconselha a aplicação do § Iº do art 9º do Decreto-lei n° 406/68. Diga-se, ainda, que não se cogita do enquadramento no § 3º do art. 9º, na medida em que este é específico ao discriminar as atividades que, quando prestadas por sociedades, ficam sujeitas ao ISS na forma do § Iº do referido dispositivo legal, não se encontrando ali mencionada a atividade de notórios e de oficiais de registro.
De forma que, feitos estes esclarecimentos, pode-se concluir que dúvida não há quanto à incidência do tributo sobre os serviços prestados pelo autor.
Face ao exposto, dá-se provimento aos recursos oficial e voluntário da Municipalidade, invertendo-se os ônus da sucumbência.
Os serviços notariais e de registro público, de acordo com o artigo 236 da Constituição Federal, são exercidos em caráter privado por delegação do Poder Público.
Este é o teor do mencionado dispositivo:
Art. 236. Os serviços notariais e de registro são exercidos em caráter privado, por delegação do Poder Público.
§ 1º - Lei regulará as atividades, disciplinará a responsabilidade civil e criminal dos notários, dos oficiais de registro e de seus prepostos, e definirá a fiscalização de seus atos pelo Poder Judiciário.
§ 2º - Lei federal estabelecerá normas gerais para fixação de emolumentos relativos aos atos praticados pelos serviços notariais e de registro.
§ 3º - O ingresso na atividade notarial e de registro depende de concurso público de provas e títulos, não se permitindo que qualquer serventia fique vaga, sem abertura de concurso de provimento ou de remoção, por mais de seis meses.
Primeiramente, quadra ponderar a plena vigência do artigo 9º, § 1º, do Decreto-Lei n. 406/68, conforme jurisprudência de ambas as Turmas que compõem a Primeira Seção desta Corte Superior.
Nesse sentido, confiram-se os seguintes precedentes:
TRIBUTÁRIO. RECURSO ESPECIAL. SOCIEDADE UNI
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