PARECER SOBRE PROCEDIMENTO ADMINISTRATIVO DE HABILITAÇÃO DE CASAMENTO
Publicado em 17/01/2011
Seguem minhas orientações quanto à conduta a ser observada pelos registradores civis diante da publicação do Ato nº 14 de 08 de novembro de 2010, do Exmo. Sr. Dr. Procurador-Geral da Justiça do Estado do Espírito Santo.
Como é de conhecimento da classe, referido ato foi publicado para dar conhecimento aos membros do Ministério Público do Estado do Espírito Santo dos termos da Recomendação nº 16, de 28 de abril de 2010, do C. Conselho Nacional do Ministério Público.
O art. 5º II dessa Recomendação possui relação com a atividade do registrador civil pois estabeleceu que é desnecessária a intervenção ministerial, depois de perfeitamente identificado o objeto da causa, nas habilitações de casamento, dispensa de proclamas, registro de casamento in articulo mortis – nuncupativo, justificações que devam produzir efeitos nas habilitações de casamento, dúvidas no registro civil.
Diante dessa situação, a primeira consideração que se faz é no sentido de que a mencionada Recomendação foi voltada para o próprio ente, ou seja, para os promotores de justiça. Ela não foi direcionada para a classe cartorária, que não tem a obrigação de considerá-la e/ou observá-la.
Ademais, o instituto da Recomendação ministerial não se impõe como ordem de coação: seu descumprimento não implica execução forçada, visto que não se constitui em título executivo. Assim, ao ente recomendado cabe a decisão acerca de sua observância ou não. Inclusive, consta expressamente na própria Recomendação que ela não possui caráter vinculativo.
A segunda consideração é que existe lei federal dispondo em sentido contrário ao que foi estabelecido no citado art. 5º II da citada Recomendação. O art. 1.526 do Código Civil dispõe que:
Art. 1.526. A habilitação será feita pessoalmente perante o oficial do Registro Civil, com a audiência do Ministério Público. (Redação dada pela Lei nº 12.133, de 2009)
Parágrafo único. Caso haja impugnação do oficial, do Ministério Público ou de terceiro, a habilitação será submetida ao juiz. (Incluído pela Lei nº 12.133, de 2009)
Não há dúvida que existem relevantes críticas sobre a redação desse art. 1.526 do CC, especialmente no que se refere à intervenção do Ministério Público. O fundamento dessas críticas, o qual inclusive se embasou o CNMP, é de que apesar do Código Civil exigir a intervenção do parquet, deve-se observar que a Constituição Federal de 1988 estabeleceu as hipóteses de intervenção ministerial, destacando em seu artigo 127 que “o Ministério Público é instituição permanente, essencial à função jurisdicional do Estado, incumbindo-lhe a defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis.”
Nesse sentido os renomados civilistas Cristiano Chaves de Farias e Nelson Rosenvald também entendem que, em razão do art. 127 da CF/1988, o Ministério Público somente deveria intervir no procedimento de habilitação quando houvesse interesse de incapaz, impugnação do pedido, oposição de impedimentos ou causas suspensivas ou ainda quando for formulado algum pedido específico pelos nubentes:
Parece-nos que, a partir da dicção do art. 127 da Lex Fundamentallis, o Promotor de Justiça somente deverá intervir nos procedimentos habilitatórios quando houver interesse de incapaz, impugnação do pedido, oposição de impedimentos ou causas suspensivas ou ainda quando for formulado algum pedido específico pelos nubentes. Todavia, não atentando para a superioridade constitucional, o Código Civil (art. 1.526) termina insinuando que a intervenção do Ministério Público deve se materializar em todas as habilitações para o casamento. (FARIAS; ROSENVALD, 2010, p. 161/162).
Inclusive encontra-se tramitando Projeto de Lei nº 1.735/07 (que fora apensado ao PL no. 420/07) que tem o objetivo de modificar o art. 1.526 do CC/2002, dispensando-se a participação obrigatória do Ministério Público nos procedimentos de habilitação para o casamento.
Portanto, a tendência da legislação é evoluir para a dispensa da intervenção do MP nos procedimentos de habilitação para o casamento.
Todavia, enquanto não houver mudança legislativa cumpre aos cartorários do Espírito Santo, no meu entender, observarem a exigência legal de intervenção do Ministério Público no procedimento de habilitação para o casamento, uma vez que prevista no art. 1.526 do CC, visando, inclusive, se resguardarem de eventual alegação de infração funcional.
Por fim, na hipótese de algum registrador civil receber ofício do Ministério Público de sua Comarca com a informação de que não mais deverá haver manifestação nas habilitações para casamento, considerando que nesse caso haverá evidente existência de dúvida do serventuário da justiça, dúvida esta que consiste em saber se observa o contido no art. 1.526 do CC ou o conteúdo do Ofício recebido do MP, sugerimos que seja observado o art. 14 do Atual Código de Normas da E. Corregedoria Geral da Justiça do Estado do Espírito Santo, de modo que o serventuário deverá submeter essa dúvida por escrito ao Juiz responsável pelo cartório ou ao Juiz de Direito Diretor do Fórum, que deverá resolvê-la. Assim dispõe o art. 14 do Código de Normas da CGJES:
Art. 14. Em caso de dúvidas ou reclamações relativas ao serviço judicial ou extrajudicial, os servidores e serventuários da Justiça deverão procurar, primeiramente, o juiz responsável pelo cartório ou o Juiz de Direito Diretor do Fórum, no âmbito de sua atribuição ou competência, que deverá resolvê-las.
§ 1º Encontrando dificuldades ou não dispondo de meios para tal, o magistrado poderá socorrer-se da Corregedoria Geral da Justiça, com o escopo de dirimir as questões suscitadas.
§ 2º As consultas enviadas diretamente ao Órgão Correicional somente serão conhecidas se acompanhadas da comprovação de que foram formuladas ao magistrado e não restaram atendidas no prazo de 10 (dez) dias.
Essas são as minhas considerações.
Rodrigo Grobério Borba
Advogado OAB/ES 11.017
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